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Escolas de Samba e Carnaval

Publicado: Quinta, 10 de Fevereiro de 2022, 15h20 | Última atualização em Segunda, 24 de Julho de 2023, 20h55 | Acessos: 1170

Este ano novamente as cidades brasileiras não verão um Carnaval. Feriado brasileiro por excelência, a festa costuma aglomerar milhões de pessoas ao longo de vários dias, e compreensivelmente foi suspensa em função da pandemia de COVID 19 que ainda assola o mundo.

As diferentes regiões do Brasil celebram o Carnaval de formas diferentes. Embora tradicionalmente o samba, o frevo e o axé sejam considerados os estilos musicais desta grande festa, atualmente outros ritmos também ganham seus espaços. Uma festa popular que sempre encarnou as especificidades regionais, também mudou ao longo do tempo. Grandes sociedades, ranchos e bailes em clubes fechados já tiveram seus momentos, assim como corsos e bandas de marchas.

As escolas de samba atualmente dividem os holofotes desta festa internacional com blocos de rua em muitas cidades do Brasil. Na década de 1980 eram a estrela quase solitária dessa festa no Rio de Janeiro. Em que contexto esta foto foi tirada? Foi em um desfile, um ensaio, uma apresentação?

 

Os desfiles das escolas de samba constituem um espetáculo grandioso. Não apenas no Rio de Janeiro, cidade de origem do evento, mas em outras cidades brasileiras também. No entanto, ao observar tamanha sucessão de brilho, criatividade, empenho cristalizados em fantasias e carros alegóricos às centenas, milhares, dificilmente imaginamos que o início da longa trajetória das escolas de samba tenha sido quase clandestino, e que as transformações que ocorreram ao longo de um século representaram uma constante luta por espaços e lugares.

A Deixa Falar foi, de acordo com a maioria dos registros, a primeira escola de samba carioca. Nasceu já com a denominação de “escola de samba” em 1928, no bairro central do Estácio, dizem que por conta da proximidade de uma escola normal (de formação de professores) com o local onde se reuniam vários bambas do samba. Apesar de pioneira, a Deixa Falar abandona a linhagem que criara ao se transformar em rancho em 1932, ano em que ocorreu a primeira competição organizada entre escolas de samba, patrocinada pelo jornal Mundo Esportivo. Este desfile realizou-se na Praça Onze e ali permaneceu até 1942.

O governo de Getúlio Vargas (1930-1945), por defender um projeto nacionalista e apresentar um discurso elaborado em torno de uma identidade genuinamente nacional, “adotou” algumas manifestações populares, embora em muitos casos “domesticando-as”. O samba foi uma dessas manifestações, parcialmente incorporada a uma identidade que se pretendia original e popular mas que deveria defender, também valores caros à moralidade oficial: a dedicação ao trabalho e à família, a ordem, o bom comportamento _ aspectos que muitas vezes escapavam totalmente a vida e obra dos sambistas e das comunidades em que viviam.

De todo modo a Prefeitura do Distrito Federal (então, o Rio de Janeiro) oficializou o desfile de escolas de samba em 1935 e incorporou-o ao calendário oficial de festejos carnavalescos. Difícil imaginar que poucos anos antes a polícia perseguia impiedosamente os sambistas, as rodas de samba e os desfiles, mas apesar da suspensão destas “agressões oficiais” a marginalização de diversos aspectos da cultura de origem eminentemente afro-brasileira continuaria por décadas.

A partir de 1942 e do arraso do centro do Rio de Janeiro promovido pelo governo em sua ampla reforma urbana na década de 1940, o desfile de escolas de samba passou a ser realizado em várias ruas do centro e pousou durante muito tempo na própria e imponente avenida Presidente Vargas, impressionante via urbana que era uma ode ao Estado Novo. A própria Praça Onze foi arrasada no decorrer das obras, e atualmente não passa de esplanada de limitada serventia pública.

De todo modo o desfile das escolas cariocas caiu no gosto da cidade e os sambas-enredo passaram a incorporar também o espírito do carnaval, além das marchinhas cantadas em blocos e bailes. Ao longo dos anos as escolas espalharam-se pela cidade (e fora dela) e ganharam a adesão da classe média, artistas, intelectuais. Agigantou-se e enriqueceu a partir dos anos 1970, transformando o evento em alvo de críticas daqueles que o consideravam um espetáculo para turistas, completamente descaracterizado e muito distante (em todos os sentidos) das comunidades que o encenam.

A década de 1980 trouxe a redemocratização do país e um antigo inimigo do governo militar, Leonel Brizola, é eleito governador do estado de Rio de Janeiro. Apresenta algumas ideias inovadoras em relação a educação, os chamados CIEPs, (Centro Integrado de Educação Pública, projeto de Darcy Ribeiro atualmente bastante descaracterizado em relação aos seus propósitos e métodos originais) e dá início ao empreendimento que marcaria seu mandato: a construção de uma passarela definitiva para os desfiles da escola de samba, que durante décadas exigia a montagem e o desmonte de arquibancadas no período do carnaval.

O projeto, de autoria de Oscar Niemeyer, previa uma área para espectadores de baixa renda, que não mais existe; e sua utilização ao longo do ano, com a inclusão de CIEPs na estrutura. As obras duraram 4 meses e resultaram no que hoje é conhecido por Sambódromo, erguido na avenida Marquês de Sapucaí, cujo trecho final, a Praça da Apoteose, foi projetada pelo notório arquiteto como espaço de congraçamento e explosão de música e dança. Atualmente este espaço encontra-se também descaracterizado, pois arquibancadas foram colocadas no espaço anteriormente circular, fazendo com que o desfile continuasse sua forma tradicionalmente linear. A estrutura também abriga um Museu do Samba.

A Passarela do Samba foi inaugurada no Carnaval de 1984. Naquele ano, duas escolas sagraram-se campeãs, de acordo com um regulamento específico: a campeã de domingo e a campeã de segunda-feira. Ambas concorreriam em um segundo desfile para obter o título de “supercampeã.” A Portela de Madureira e a Estação Primeira de Mangueira sagraram-se campeãs, com a vitória final desta última.

As escolas de samba também passaram pelo corriqueiro processo censório no período da ditadura militar, e embora algumas agremiações apresentassem sambas e enredos ufanistas em uma tentativa de angariar a boa graça oficial, outras acabaram sofrendo a atuação dos órgãos censores em consequência de temas considerados controversos ou questionadores demais (liberdade, por exemplo). Na década de 1980, quando o Sambódromo (oficialmente chamado de Passarela do Samba Darcy Ribeiro) foi construído, o medo de que fantasias e enredos pudessem ser censurados já não era tão presente, mas os órgãos de censura ainda cumpriam suas obrigações burocráticas de verificar a propriedade dos desfiles. O material aqui exibido pertence ao fundo Serviço de Censura de Diversões Públicas. 

BR RJANRIO TN.CPR.CNV, ESS.106 Solicitações de censura de figurinos, fotos coloridas enredo e sambas enredo. Apresentações de figurinos em fotos originais coloridas. Apresentações original de enredo (Um Herói, Uma Canção, Um Enredo"); 1984 

BR RJANRIO TN.CPR.CNV, ESS.82: Solicitação original de censura de figurinos, alegorias, tema enredo e samba enredo "Yes Nós temos Braguinha" (Supercampeã); 1984

 

 Leitura recomendada

de FIGUEIREDO, G. A. (2011). A Passarela do Samba de Oscar Niemeyer: o abrigo e o monumento do carnaval das escolas de samba do Rio de Janeiro. In 9th Workshop on Interdisciplinarity and Experience in Documentation and Preservation of Recent Brazil (p. 6).

Matos, M. P. (2006). Da Praça Onze à Praça da Apoteose: a luta pelo lugar do carnaval. Contemporânea (Título não-corrente)4(1), 47-57.

 

 

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