Primeiro Congresso Nacional de Mulheres Rurais
Entre os dias 25 a 28 de novembro de 1986, ocorreu, em Brasília, o Primeiro Congresso Nacional de Mulheres Rurais, organizado pela EMBRATER e que contou com o apoio do Conselho Nacional de Direitos da Mulher (CNDM). Representantes de trabalhadoras rurais de todo país discutiram temas relacionados à produção agropecuária, à questão fundiária e aos direitos civis das mulheres do campo. A década de 1980 foi marcada pelo surgimento dos movimentos específicos de mulheres rurais nas mais diversas regiões do Brasil, apesar da participação dessas mulheres nas lutas do campo não serem um fato novo. Suas raízes remontam às atividades dos Comitês Eclesiais de Base (CEBs), braço da igreja Católica ligado à Teologia da Libertação. A demanda primeira dessas organizações femininas foi o reconhecimento político das trabalhadoras rurais, tanto pelo Estado, quanto pelo próprio movimento sindical do campo que, desde o seu surgimento, estabeleceu-se como espaço de poder e ação masculino.
O processo de organização das trabalhadoras rurais ganhou mais força e visibilidade a partir de sua articulação com os movimentos feministas e de mulheres que emergiam no contexto de reabertura democrática. A criação do CNDM em 1985, por exemplo, reforçou esse movimento, ao estabelecer um braço do Estado no apoio às lutas políticas femininas. O Conselho, trabalhando em conjunto com o crescente movimento das trabalhadoras rurais, foi um dos grandes responsáveis pelo aumento da atenção do poder governamental às questões referentes à mulher do campo (DEERE, 2004).
No período de 1986 a 1988, os movimentos de mulheres no país mobilizaram-se para participar ativamente do processo de elaboração da nova Constituição, buscando incluir em seu texto demandas históricas do movimento feminista por igualdade entre os sexos. A Carta de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, foi resultado de um processo que contou com a ampla participação da sociedade civil. Através de emendas populares e audiências públicas, os congressistas puderam dialogar com diferentes grupos sociais, inclusive os movimentos de mulheres, entre eles, os das trabalhadoras rurais. Para conhecer um pouco mais da participação feminina na Constituinte de 1987/88, acesse o link.
As mulheres do campo tiveram presença efetiva no Congresso Nacional durante esse período, seja através de abaixo-assinados, de marchas e/ou eventos em Brasília e em seus estados, onde defendiam a ampliação dos direitos civis da trabalhadora rural. Foi o caso do Congresso Nacional de Mulheres Rurais, documentado em imagens em movimento pelo CNDM. À luta pelo reconhecimento de seu estatuto profissional – trabalhadoras rurais, e não empregadas domésticas como aparecia em suas carteiras profissionais, quando a tinham – e pelo direito a sindicalização, não apenas na condição de dependentes de seu maridos ou pais, somaram-se outros direitos sociais das quais eram excluídas pela invisibilidade do seu trabalho, como o direito à aposentadoria e ao salário maternidade.
Seu engajamento na Assembleia Constituinte e a grande pressão exercida entre os congressistas pelo movimento garantiram a inclusão formal de direitos para a mulher do campo na Constituição Federal, que estabelecia: o título de domínio e a concessão de uso da terra serão conferidos, por meio de Reforma Agrária, ao homem ou à mulher, ou à ambos, independente do estado civil – o que assegurava, explicitamente, o direto da mulher à terra; inclusão da profissão de trabalhadora rural como beneficiária da previdência social para todos os fins (aposentadoria, licença-saúde, licença-maternidade, seguro-desemprego e por invalidez); além disso, a idade de aposentadoria para mulheres rurais foi estipulada em 55 anos e para os homens rurais em 60 anos, ou após 30 anos de serviço para mulheres e 35 para homens, cinco anos a menos do que os trabalhadores urbanos.
As imagens do CNDM trazem depoimentos de mulheres de participaram do Congresso em Brasília. Elas explicitam suas reivindicações quanto ao acesso à terra, ao crédito bancário para os pequenos produtores, à participação política das mulheres nos sindicatos rurais, aos conflitos de terra, entre outros. Assista o filme.
Legenda do filme: Primeiro Congresso Nacional de Mulheres Rurais. Brasília, novembro de 1986. Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres. BR RJANRIO EZ.0.FIL.195.
Sugestões de leitura:
AGUIAR, Vilenia Venancio Porto. Mulheres Rurais, Movimento Social e Participação: reflexões a partir da Marcha das Margaridas. Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 15 - Edição Especial - 2016.
CARNEIRO, Maria José. "Mulheres no campo: notas sobre sua participação política e a condição social do gênero". Estudos, Sociedade e Agricultura, n. 2, p. 11-22, 1994.
DEERE, Carmen Diana. Os direitos da mulher à terra e os movimentos sociais rurais na reforma agrária brasileira. Rev. Estud. Fem. [online]. 2004, vol.12, n.1, pp.175-204.