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O Brasil já foi o maior exportador de cacau do mundo, mas atualmente, embora ocupe a sétima posição em produção, não consegue suprir a crescente demanda interna e se vê obrigado a importar amêndoas de cacau de países da África. Se a produção no campo vem enfrentado problemas e instabilidades, em especial nos últimos 30 anos, o parque industrial de processamento do mesmo e da produção de chocolates prosperou.

Um dos únicos (senão o único) países do mundo a possuir toda a cadeia produtiva em seu território (do plantio do cacau ao seu processamento, e até a fabricação e comercialização de chocolate) na última década o Brasil tenta retomar investimentos e pesquisas no setor, incentivando especialmente a produção de cacau de alta qualidade e a fabricação de chocolates finos.

A produção de cacau passou por um grande boom na primeira metade do século XX, mormente nas décadas de 10 e 20. Neste período, que ainda é conhecido como “ciclo do cacau”, o plantio se dava basicamente no sul da Bahia. A riqueza auferida pelos grandes magnatas do cacau – os grandes “coronéis” – povoou o imaginário popular durante décadas, inspirou livros (Jorge Amado escreveu diversas obras em torno do tema), e novelas. Muitas vezes denunciando a violência das disputas por terras de plantio e poder político na região, tais obras marcaram a nossa literatura e nossa indústria cultural.

Originário da região amazônica e matéria prima central na fabricação de um dos produtos mais vendidos e desejados do mundo (o chocolate), o cacau não só se adaptou muito bem a região sul da Bahia como ali prosperou. No entanto, como qualquer produto de exportação o cacau sofreu alguns reveses ao longo do século XX, consequência das crises internacionais ou dos caprichos do mercado. A Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), atualmente órgão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, foi criada em 1957 no contexto da segunda crise da produção de cacau (a primeira ocorrera com a crise de 1929), causada pela entrada maciça dos produtores do continente africano no mercado internacional. 

Mas nenhuma das crises se compara à iniciada na segunda metade da década de 1980, em grande parte resultado da ação de um fungo devastador causador da praga vassoura de bruxa que, somada a crise econômica ocorrida na segunda metade daquela década, à seca e a outras pragas que assolaram a região desestabilizou e desorganizou toda a produção cacaueira na Bahia. Em 1995 o governo federal lançou o Programa de Recuperação da Lavoura Cacaueira Baiana que através de empréstimos e pesquisas realizadas no âmbito da própria Ceplac, buscava incentivar projetos de combate ao fungo e de recuperação das lavouras. Mas somente com a introdução de técnicas de clonagem, já na virada no século, o combate começou a apresentar resultados.

A desarticulação da produção cacaueira apresentou dois efeitos perceptíveis, sendo que um deles imprevisível: “A vassoura de bruxa é a madrinha da reforma agrária aqui na região”, define Júlia Oliveira, coordenadora da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag-BA). A crise que deixou mais de 200 mil pessoas sem trabalho não trouxe apenas o êxodo rural, mas também uma intensificação da organização dessa força de trabalho agora desprovida de renda, que passou a lutar pela implementação da reforma agrária. Segundo o Repórter Brasil,  dos 113 assentamentos localizados naquela área, onde residem aproximadamente seis mil famílias, a esmagadora maioria foi criada na década de 90 em grandes fazendas abandonadas por proprietários descapitalizados. O outro efeito foi o crescimento exponencial de outra região cacaueira, desta vez no Pará.

Atores de toda a cadeia produtiva vêm se organizando no sentido de modernizar e incrementar a produção e o processamento do cacau, alinhando-a com a produção e a comercialização/ exportação de chocolate. A CocoaAction Brasil foi “uma iniciativa única no setor, que colabora para o alinhamento e desenvolvimento da cadeia de cacau no país, promovendo intercâmbio de conhecimentos e sinergias com trabalhos já existentes, de modo a melhorar a produtividade e rentabilidade dos produtores, com atenção especial para a sustentabilidade.”

Embora a participação do Brasil no mercado exportador seja pequena, o país tornou-se “um intermediário na cadeia de abastecimento do chocolate, importando grãos de cacau para processamento interno e exportando produtos semiacabados (manteiga, gordura e óleo de cacau, cacau em pó e pasta de cacau).”(relatório Brainer) Atualmente Bahia e Pará dividem a liderança na produção de cacau, sendo que o estado do norte apresenta um acentuado crescimento desde o ano 2000, com uma produtividade significativamente superior a do estado nordestino, que ainda luta para reverter o processo de decadência da produção.

 

Trecho de documentário da Agência Nacional em que são apresentados aspectos das plantações, da colheita, da industrialização e da exportação de cacau no Brasil. O vídeo mostra também as pesquisas desenvolvidas no país pela CEPLAC para a melhoria da qualidade do cacau brasileiro. Brasil Hoje nº  50 (1974). Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional. BR_RJANRIO_EH_0_FIL_BHO_50

 

Recomendações de leitura

BRAINER, M. S. D. C. P. (2021). Produção de cacau.

Piasentin, Flora Bonazzi, & Saito, Carlos Hiroo. (2014). Os diferentes métodos de cultivo de cacau no sudeste da Bahia, Brasil: aspectos históricos e percepções. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 9(1), 61-78. https://doi.org/10.1590/S1981-81222014000100005

 

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