Há uma dificuldade inerente em calcular o número de nativos brasileiros vivendo aqui em 1500, quando da chegada dos europeus nas terras do continente americano que se tornariam o Brasil, mas o cálculo da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) gira em torno de 3 milhões de indivíduos distribuídos por diversas etnias e espalhados por todo o território. Atualmente, são cerca de 800 mil pessoas que se autodeclaram indígenas no Brasil, de acordo com censo do IBGE.
O sistemático genocídio indígena deu-se de variadas formas: massacres de aldeias inteiras e assassinatos de lideranças e famílias, disseminação (deliberada ou não) de doenças contra as quais os nativos não possuíam defesa ou remédio, transferências forçadas para terras pobres onde os povos não conseguiam prover seu sustento, o estabelecimento de órgãos e leis que, embora tivessem como objetivo manifesto a salvaguarda da vida e dignidade indígenas, na prática atuaram na direção contrária, favorecendo o roubo de suas terras e a destruição de aldeias e indivíduos, em prol de grandes empresas, latifundiários e dos planos de “desenvolvimento nacional” do Estado.
Em 1988 a Constituição promulgada em outubro passou a garantir o respeito e a proteção à cultura das populações originárias, ao menos no papel. Contudo, dependente (como em outros pontos) de regulamentações específicas e atingida por emendas constitucionais que a cada ano deturpam a Carta Maior, os direitos indígenas (inclusive à vida) continuam a ser desrespeitados e suas terras, invadidas _ por garimpeiros, madeireiros, pecuaristas, grandes empresas agropecuárias. Apenas a título de exemplo de desrespeito aos povos nativos nos últimos anos, podemos citar o aumento do desmatamento em terras indígenas: entre agosto de 2018 e julho de 2019, houve um crescimento de 75% em relação período de agosto de 2017 a julho de 2018. Em 2019, o Brasil teve o maior número de lideranças indígenas assassinadas em 11 anos. Em março de 2020 o país foi denunciado na ONU pelo desmonte das políticas ambientais e indigenistas e pelo risco elevado de genocídio de povos indígenas isolados pelas entidades Instituto Socioambiental, a Comissão Arns e a Conectas Direitos Humanos.
O Arquivo Nacional possui em seu acervo um volume impressionante de documentação que registra a história do genocídio e etnocídio indígenas. O filme aqui apresentado, de nome Descaminhos, reúne imagens em movimento e arquivos sonoros dos fundos Agência Nacional, Comissão Nacional da Verdade, Departamento Nacional de Estradas de Rodagem, Diretoria de Telecomunicações da Secretaria de Administração da Casa Civil, Nicole Algranti, Secretaria de Imprensa e Divulgação da Presidência da República. Fotografias, documentação escrita e mapas estão disponíveis nos fundos Assessoria de Segurança e Informações da Fundação Nacional do Índio, Comissão Nacional da Verdade, Correio da Manhã, Francisco Bhering. Ele foi realizado por ocasião da exposição Itinerários Indígenas, montada nas dependências do Arquivo Nacional em 2017 e atualmente disponível em ambiente virtual.
O segundo volume do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade de 2014 [BR RJANRIO CNV.0.CVE.00092000508201511], assim como todo o acervo relacionado a CNV encontra-se na base de dados do Arquivo Nacional, e trata, entre outras, das violações aos direitos humanos dos indígenas cometidas no período entre 1946 e 1985.
Santo Martins, F. D. E. (2018). AS SOCIEDADES INDÍGENAS E A COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. Espaço Ameríndio, 12(2), 386.
Palmquist, H. (2018). Questões sobre genocídio e etnocídio indígena: a persistência da destruição. Belém: UFPA.
Will, K. L. P. (2014). Genocídio indígena no Brasil. Dissertação de mestrado, Universidade de Coimbra.