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Ano: 1970. Mais de um ano de vigência do Ato Institucional número 5, que concedia ao executivo amplos poderes e deixava o cidadão comum desprovido do mesmo, vulnerável diante de um regime ditatorial que mesmo antes do referido ato contava com a atuação de agentes das forças armadas e de segurança pública que agiam ao largo da ordem legal para prender, torturar, matar e desaparecer opositores políticos. Também o ano em que o Brasil conquistou o tricampeonato de futebol no México, em junho, feito amplamente celebrado nas ruas das cidades brasileiras e pelos generais que ocupavam o poder, ávidos em absorver aquela vitória esportiva como uma vitória do regime. Em 1970 também houve eleições no Brasil. Sim, aquele regime ditatorial instaurado com o golpe em 1964 esforçava-se por manter um simulacro de democracia e legitimidade, organizando eleições periódicas – àquela altura, apenas para cargos no legislativo e tão cerceada por regras criadas para garantir a vitória do governo estabelecido que acabaram por se tornar alvo de discreto deboche.

O bipartidarismo compulsório foi uma das regras inventadas para favorecer o regime, e deu certo naquele ano, já que a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), governista, conquistou a maioria no Congresso Nacional e também venceu nas eleições regionais, onde ocorreram. No ano da Copa, o ufanismo estava em alta: foi o ano do “Brasil, ame-o ou deixe-o”, palavras de ordem que buscavam identificar o brasileiro com uma noção estreita de país, de nação, incorporada e defendida a ferro e sangue pelo governo militar. Esse tipo de estratégia insidiosa transforma em inimigos da pátria quaisquer pessoas que possuem uma visão diferente imposta pelos ditadores, ao mesmo tempo em que intima o cidadão comum a aderir fervorosamente ao poder estabelecido.

O vídeo aqui apresentado pode parecer, para nós, em 2023, pouco envolvente e mesmo confuso. Mas no contexto do ufanismo desmedido e do silêncio da imprensa diante das atrocidades nas celas das polícias a propaganda exibe um Brasil vitorioso e trabalhador. E é a este trabalhador comum e precioso, mas que precisa permanecer em seu silencioso e apolítico lugar, que a propaganda se dirige. A mensagem: você, cidadão trabalhador que se dedica com seriedade as suas atividades laborais e sua família, que aprecia a pátria de chuteiras e não se aventura em searas que não lhe dizem respeito, precisa votar conosco, com o governo que encarna a amada pátria e a defende dos inimigos.

Distribuição de camisas a jovens jogadores de futebol (música: Hino da seleção brasileira); partida de futebol, homem pinta copos de vidro, joalheiro analisa pedras, separa grãos, analisa bebidas, mulher seleciona flores, voto sendo posto na urna (locução fala da importância de escolher nas próximas eleições)                               BR RJANRIO U3 0.FIL, FIT.480     Secretaria de Imprensa e Divulgação da Presidência da República

Leitura recomendada

de Castro Netto, D. A. (2019). Ditadura militar, propaganda e otimismo no Brasil dos anos 1970. Revista Trilhas da História, 8(16), 72-96.

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