Uma visita insólita.
Jânio Quadros foi eleito presidente em 03 de outubro de 1960. Assumiu em janeiro do ano seguinte, juntamente com João Goulart, candidato a vice na chapa que concorreu com Jânio (na época, o eleitor escolhia tanto o presidente quanto o vice, não havendo obrigatoriedade de os dois serem da mesma chapa).
Apenas oito meses depois, em agosto de 1961, Jânio Quadros renunciava ao cargo, desencadeando uma crise institucional contornada apenas com a instalação do sistema parlamentarista no Brasil, solução aprovada no Congresso Nacional para que o vice João “Jango” Goulart (cujas posições eram consideradas demasiadamente nacionalistas e intervencionistas pelas elites da época) não assumisse.
Candidato a presidente, o então deputado por São Paulo Jânio Quadros chegou em Havana, Cuba, em 29 de março de 1960. Foi recebido com honras de chefe de estado por Fidel Castro, alçado a autoridade máxima depois da revolução do ano anterior que derrubara o ditador Fulgêncio Batista. Durante os sete dias em que permaneceu no país, Jânio ainda conheceu Che Guevara e o irmão de Fidel, Raul Castro.
A visita do candidato gerou polêmica, inclusive entre seus próprios correligionários. Em tempos de guerra fria, visitar um estado comandado por revolucionários de clara tendência anti-americana poderia significar a morte política: candidato do pequeno PDC (Partido Democrata Cristão), que tendia a se alinhar a UDN no espectro à direita da política nacional, Jânio desagradou muitos dos seus apoiadores e também os militares, que há tempos insistiam em uma suposta “ameaça vermelha” a pairar sobre o Brasil. Sua popularidade, contudo, continuou intocada, e populares o acompanharam até o aeroporto na ida e o receberam na volta.
Não satisfeito em visitar Cuba a convite do “Movimento 26 de julho”, Jânio também se absteve de críticas ao novo governo, ao contrário: teceu elogios discretos à liderança de Fidel. Depois de eleito, Jânio ainda concederia a medalha da Ordem do Cruzeiro do Sul ao revolucionário argentino radicado em Cuba, Che Guevara. Durante seu curto governo, seguiu a proposta de estabelecer relações com as nações do bloco socialista, visando especialmente o comércio, recebendo lideranças chinesas e soviéticas durante seu mandato.
Apesar da crise dos mísseis em Cuba no ano de 1961, a polarização extrema entre os blocos socialista e capitalista começava a encontrar uma válvula de escape, uma “terceira via,” seguida por alguns governos que não desejavam engessar suas opções em termos de política e comércio externos em função das disputas entre soviéticos e estadunidenses. O Movimento dos Não-Alinhados, iniciado em 1955 na Conferência de Bandung, ganhou a adesão de países como Índia, Egito, Iugoslávia. Durante os breves governos de Jânio Quadros e Jango, o Brasil buscou aproximar-se deste posicionamento, processo interrompido pelo golpe militar de 1964.
O vídeo mostra a visita de Jânio a Cuba enquanto candidato a presidência da República.
BR RJANRIO NK.0.RAV.6. Deputado Jânio Quadros desembarca no aeroporto de Havana, onde concede entrevista coletiva como candidato à presidência da República, e é recebido pelo presidente Fidel Castro. Presença do senador Afonso Arinos de Melo Franco e da filha do deputado, Tutu Quadros. Março de 1961.