Aos gritos de “Sarney salafrário, está roubando meu salário,” e “Sarney, ladrão, Pinochet do Maranhão” uma multidão enfurecida cercou o ônibus em que o então presidente da República José Sarney se encontrava, diante do Paço Imperial, centro do Rio de Janeiro. Militantes sindicalistas mais exaltados chegaram a quebrar o vidro da janela do presidente, ferindo-o na mão.
O protesto havia sido organizado pelos partidos PDT (de Leonel Brizola), PT e pela CUT (Central Única dos Trabalhadores) e ocorreu em 25 de junho de 1987, uma semana antes de outra rebelião transformar o centro da cidade em praça de guerra: com o aumento de passagens de ônibus de 49% (em pleno congelamento geral de preços e salários, determinado pelo governo 3 semanas antes), usuários incendiaram 60 ônibus e destruíram outro tanto.
No ano anterior, Brasília havia sido tomada pelo “Badernaço,”em novembro de 1986, durante o qual uma população enfurecida com uma enxurrada de aumentos expressivos em meio a um cenário de congelamento de salários saqueou, depredou e incendiou lojas, lixo, instalações públicas.
O posicionamento do governo Sarney, de forma coerente com seu passado, expressava não apenas sua falta de compromisso com a democracia civil como sua crença em soluções militarizadas: tanques urutus voltaram as ruas, pessoas foram presas sem mandato, a Lei de Segurança Nacional foi invocada. No caso do Rio de Janeiro, buscou-se criminalizar as organizações à frente do protesto que saiu de controle, ou seja, os partidos que eram os maiores inimigos de José Sarney.
O governo de José Sarney foi marcado por alguns planos de estabilização econômica que buscavam controlar a inflação desenfreada que castigava o salário dos brasileiros. O Plano Cruzado (como ficou conhecido o primeiro deles, lançado no início de 1986 sob a liderança do ministro da fazenda Dilson Funaro) substituiu a moeda cruzeiro pelo cruzado, congelou preços e indexou dos salários, entre as medidas mais diretamente perceptíveis para o grande público. Inicialmente a adesão popular foi enorme, mas o desastre que estava por vir já mostava sinais em meados de 1986. Visando as eleições para governador e para o Congresso em novembro daquele ano, Sarney sustentou ao máximo o congelamento de preços, o que garantiu uma esmagadora vitória ao partido de sustentação do governo, o PMDB. Contudo, poucos dias depois das eleições, é anunciado o Plano Cruzado II, aumentando impostos indiretos, reajustando preços de bens e serviços defasados, concedendo alguns subsídios para as exportações. Os salários continuaram perdendo para a inflação, que voltou com força total e no primeiro bimentre de 1987 a taxa anual já chegava a 337%.
A partir de 1987, as aparições públicas de José Sarney precisaram ser acompanhadas por amplo aparato policial. A despeito da sua impopularidade como presidente, ele continuaria a influenciar a politca nacional a partir do senado, onde ocupou uma cadeira entre 1991 e 2015.
Documento da matéria na íntegra: BR_DFANBSB_V8_MIC_GNC_CCC_87014937
Leitura:
Verbete SARNEY, José. FGV-CPDOC. http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/jose-ribamar-ferreira-de-araujo-costa
Verbete Plano Cruzado. FGV-CPDOC. http://www.fgv.br/Cpdoc/Acervo/dicionarios/verbete-tematico/plano-cruzado
MACARINI, José P. A política econômica do Governo Sarney: o colapso do Plano Cruzado (1986-1987). Texto para discussão. IE/UNICAMP, Campinas, n. 128, 2007.
GUILHERME, Cássio Augusto. O GOVERNO JOSÉ SARNEY (1985-1990) TRANSIÇÃO SEM RUPTURA. Confronteiras, v. 1, n. 1, 2017.