O segundo artigo do Ato das Disposições Transitórias da Constituição promulgada em 1988 determinava a realização de um plebiscito previsto para setembro de 1993 (que acabou antecipado para abril de 93) que decidiria a forma (Monarquia ou República) e o sistema (parlamentarismo ou presidencialismo) de governo.
O plebiscito é um dispositivo de consulta pública via voto direto, convocado pelo Congresso Nacional. Está previsto na nossa Carta Maior no artigo 14: “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
III - iniciativa popular. “
Difere do referendo por ser uma consulta prévia, enquanto que o primeiro chama o povo a rejeitar ou ratificar decisão prévia do órgão legislativo (uma lei ou emenda constitucional). Sua convocação também é de responsabilidade do Congresso Nacional. O resultado tanto do plebiscito quanto do referendo é sempre uma prescrição, ou seja, a decisão do povo é soberana e deve ser seguida.
Assim, seguindo-se a determinação constitucional, o povo brasileiro foi chamado a escolher a forma e o sistema de governo. Com o início da crise do governo Collor de Melo, houve uma tentativa de antecipar o plebiscito para 1992, que o ainda presidente logrou impedir. No entanto, em abril de 1992, quando tornou-se claro que a crise de governabilidade atingia proporções incontroláveis, o Congresso decidiu antecipar o evento em alguns meses. Quando os brasileiros finalmente foram às urnas, em abril de 1993, Collor já havia sofrido o impeachment, fato por vezes utilizado por ambos os lados da campanha como argumento em favor do presidencialismo ou do parlamentarismo.
Alguns partidos adotaram uma posição oficial intransigível (PT e PDT pelo presidencialismo, PSDB e PC do B pelo parlamentarismo), mas a maioria deles não se opôs a escolha individual dos políticos a eles filiados. A partir de fevereiro, a campanha na mídia (realizada em pequenos blocos ao longo do dia) engajou políticos e personalidades na discussão acerca das vantagens e desvantagens de cada sistema de governo. Também a forma de governo foi discutida, embora na época os adeptos da monarquia (inclusive a antiga família real brasileira, deposta em 1889) fossem vistos por alguns como um grupo um tanto excêntrico.
Uma das críticas feitas a forma com que o plebiscito foi organizado diz respeito a limitação das escolhas do cidadão, já que tanto a via presidencial quanto a parlamentar oferecem possibilidades e mesmo opções híbridas de sistemas de governo que não estavam ao alcance do eleitor. Assim, o povo não poderia opinar acerca das muitas vias a serem seguidas a partir da escolha de um dos sistemas de governo, alienando-o assim da parte mais importante do processo. Muitos chamaram atenção para a ausência de possibilidade de escolha em matérias tão relevantes quanto, como o voto distrital, a organização partidária, voto obrigatório, entre outros pontos. Também salientou-se a incongruência da Constituição Federal com o sistema monárquico por exemplo, exigindo que a Carta Maior fosse inteiramente revista caso esta opção vencesse. O que aliás, também teria ocorrido (em menor medida) caso o parlamentarismo tivesse saído vitorioso, já que a constituição estrutura o funcionamento do Estado presumindo-se um sistema presidencialista.
O resultado – a vitória do presidencialismo e da República – não surpreendeu. A tradição de mais de cem anos de República presidencialista prevaleceu e as discussões rasas e oportunistas que dominaram a propaganda na época, além das limitações inerentes ao processo plebiscitário, diminuíram as já pequenas chances de vitória de um sistema alternativo.
O documento apresentado nesta seção tem por notação BR_DFANBSB_H4_MIC_GNC_DIT_940076560_d0001de0001. O jornal que ilustra a matéria faz parte do processo. Secretaria de assuntos estratégicos da presidência da República.
BARRETO, T. Velho. Propostas de arranjos institucionais na transição para a democracia no Brasil. O caso do plebiscito de 1993 sobre a forma e sistema de governo. Democracia e instituições políticas brasileiras no final do século XX, Recife, Bagaço, 1998.
CORRÊA, Felipe Santos. Mecanismos de democracia semidireta no Brasil e o plebiscito de 1993: participação popular e a problemática do sistema de governo. 2016. 34 f. Monografia (Bacharelado em Direito)—Universidade de Brasília, Brasília, 2016.
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