As conquistas alcançadas por aqueles que lutam pelos direitos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais) nas últimas décadas vêm acompanhadas do aumento da intransigência, violência e ódio a eles direcionados por parcelas da população que se identificam com valores reacionários e/ ou conservadores. Embora atualmente a homofobia seja considerada um crime (decisão do Supremo Tribunal Federal de 2019, ampliando o entendimento da Lei de Racismo (7716/89) e o casamento entre pessoas do mesmo sexo seja legalizado, os ataques verbais e físicos contra aqueles que não seguem os padrões heteronormativos não parece arrefecer.
A apropriação da ofensa dirigida a um determinado grupo marginalizado da sociedade e sua transformação em arma através do escárnio, deboche e desconstrução é um mecanismo de defesa e publicização de agenda comum a várias “minorias”, e ele foi utilizado com afinco pelo movimento gay no Brasil dos anos 1970, que fazia uso de termos degradantes como “bicha” e “veado” para desmascarar e desmoralizar aqueles que desejavam, com tais termos, ofendê-los.
A imprensa gay foi fundamental nesta luta; seu primeiro veículo nacional, Lampião da Esquina circulou entre 1978 e 1981, contou com um conselho editorial que incluía intelectuais e artistas do eixo Rio-São Paulo (como Darcy Penteado, Peter Fry, Aguinaldo Silva, João Silvério Trevisan, João Antônio Mascarenhas e outros).
Contudo, o Lampião não foi o primeiro jornal em defesa da causa homossexual no Brasil. Em 1978 o chamado Círculo Corydon articulava-se para divulgar o Dia de Comemoração do Gay, para pensar em uma bandeira do movimento, e para divulgar a história (desenrolada principalmente nas sombras) do movimento gay no Brasil desde _ segundo eles _ a década de 1940. Eles também foram responsáveis pela publicação do Jornal do Gay e a revista Gay News, editados em São Paulo e distribuídos em várias capitais. O Jornal do Gay focava basicamente no aspecto cultural e artístico do movimento, enquanto a revista buscava suscitar um debate político e ideológico mais intenso.
A homossexualidade começou a sair do armário na década de 1980, quando este nicho de consumo bastante específico e com potencial financeiro amplo foi identificado (e alimentado) pela indústria em geral, de vestuário a entretenimento. Uma “estética gay” foi incorporada pela publicidade principalmente a partir da década seguinte, em função do aumento do mercado.
Desde a década de 1960 a imprensa chamada alternativa desafiava não apenas os usos e costumes estabelecidos e defendidos por uma sociedade conservadora, mas também as determinações de uma ditadura militar que, em especial entre 1968 e 1974 permitia pouquíssima margem de discordância. No escasso espaço para discussão e dissensão, a imprensa alternativa tentava discutir política educacional, contracultura, guerra, juventude, sexualidade, desemprego, política econômica e o outros assuntos evitados pela grande imprensa. Como não podia deixar de ser, os governos militares ditatoriais vigiavam e, ocasionalmente, reprimiam as manifestações públicas de homossexualidade, em consonância com sua apregoada defesa da “moral e bons costumes da família brasileira” (sic).
BR DFANBSB V8.MIC, GNC.AAA.79003580: Homossexualidade, Movimento Gay no Brasil e no mundo (documentação em inglês, francês e espanhol). Jornais e fotografias. Abril, 1979. Dossiê. Serviço Nacional de Informações.
Informes da Divisão de Segurança e Informações do Ministério da Justiça (DSI/MJ), mês de outubro de 1979. Informes tratando de temas diversos como: Fernando Henrique Cardoso, Teatro Paiol (Curitiba/PR), panfleto, Anistia, UNE, cinema, filme "Braços Cruzados, Máquinas Paradas", Centro de Comunicação Social do Nordeste (PE), DCE/UFPE, Órgãos de Segurança, Operação Pajussara, Carlos Lamarca, D. Paulo Evaristo Arns, padre Domingos Barbé, Mário Carvalho de Jesus, Paulo Freire, padre José Comblin, Frente Nacional do Trabalho (FNT), publicidade, imprensa contestatória, jornal "Folha de São Paulo", Movimento Gay, homossexualismo, Círculo Corydon, Aldo Arantes, Assembléia Legislativa de Goiás, trabalho escravo (MT), conflito de terras, jornal "O Trabalhador", Centro Cultural Operário de São Paulo, OAB/RS, Secretaria de Cultura de Londrina (PR), filme "25", Moçambique, Leonel Brizola, Diógenes de Arruda Câmara, PC do B, Gregório Bezerra, retorno dos exilados, Roberto Freire, Pedro Paulo Baraúna, Congresso do PCB.
Recomendações de leitura
Cordão, V. F. R. A IMPRENSA GAY DO CIRCULO CORYDON EM PROL DA CIDADANIA HOMOSSEXUAL.
Lima, M. A. A. (2001). Breve histórico da imprensa homossexual no Brasil. Biblioteca On-line de Ciências da Informação.