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A “Noite de Música Popular” foi um grande evento organizado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), em janeiro de 1940, reunindo a nata dos compositores e cantores nacionais, nas categorias “samba” e “marchinha”. Na imagem, dois grandes de nossa música, fotografados pela Agência Nacional – agência de notícias criada pelo governo, em 1937, cujas fotografias se encontram no Arquivo Nacional. Você sabe dizer quem são esses dois que estão próximos ao microfone? Antes de dar a resposta, vamos explicar para você essa história em detalhes...

O Estado Novo foi criado em 15 de novembro de 1937. Ao contrário do que se pensa, o DIP, órgão principal de propaganda e censura da ditadura, não surgiu imediatamente após o golpe, mas apenas no apagar das luzes de 1939, atuando pra valer a partir dos primeiros dias de 1940. Porém, anteriormente, já existiam outros órgãos com funções semelhantes, como o Departamento Nacional de Propaganda (DNP), antecedente do DIP e que terminou extinto quando da fundação de seu sucessor. 

Uma das primeiras ações do DIP foi a organização de um concurso de música já no mês de janeiro de 1940, realizado no antigo campo do América, na Tijuca, no Rio de Janeiro. Estádio esse fundado em 1924, na Rua Campos Sales, com capacidade para 15 mil pessoas – cabe lembrar que, na época, não havia rigidez com normas de segurança que reduzissem a quantidade de pessoas no local, e que essa capacidade seria bem menor hoje em dia. Lá ocorreram diversos eventos como o lançamento da candidatura de Armando Sales Oliveira para a presidência, em 1937, na eleição que acabaria não acontecendo em razão do golpe de Estado de novembro daquele ano.

O concurso foi batizado de “Noite de Música Popular” e tinha como objetivo a arrecadação de fundos para a construção de dois abrigos para crianças carentes: “Pequeno Jornaleiro” e “Casa das Meninas”, ambos sob a responsabilidade de Darcy Vargas, a esposa do presidente da República. Cabe lembrar que o DIP, pelo artigo 2º do decreto-lei 1915, de 27 de dezembro de 1939, era autorizado a “fazer a censura do Teatro, do Cinema, de funções recreativas e esportivas de qualquer natureza, de radiodifusão, da literatura social e política, e da imprensa, quando a esta forem cominadas as penalidades previstas por lei”. As canções deveriam ter um “perfeito brasileirismo”, o que mostra o impacto nacionalista e a censura que se debruçavam sobre a arte, para que esta atendesse aos anseios da ditadura. Não seriam admitidas, de modo algum, músicas concorrentes que estimulassem críticas ao governo, que tocassem em temas polêmicos ou que versassem sobre conflitos entre as classes sociais. 

O evento foi patrocinado pelo Cassino da Urca, que ofereceu cinco contos de réis aos vencedores, e teve também o apoio das Rádios Tupy, Club, Nacional e Cruzeiro do Sul. A fábrica de discos Odeon se propôs a gravar as melodias destacadas pelos jurados, enquanto a Panair do Brasil ofereceu passagens de ida e volta para Buenos Aires também como premiação. Como é possível perceber, a grande dimensão do concurso, tal qual os diversos prêmios oferecidos, atraíram os melhores compositores brasileiros da época. 

É importante destacar, na fotografia, a brilhante e histórica dupla Ataulfo Alves e Wilson Baptista, dois ícones geniais da música brasileira, que compuseram a música "Oh, seu Oscar" para concorrer à disputa, que seria julgada por um júri de cinco membros: os compositores Luiz Peixoto e Pixinguinha, os cronistas radiofônicos Eduardo Brown e Caribé e o maestro Heitor Villa-Lobos, que presidiria a comissão de avaliação.  

Ataulfo e Wilson foram os grandes vencedores na categoria samba e “Oh, seu Oscar” caiu no gosto popular, sendo aclamado e cantado amplamente pelo povo no carnaval de 1940 – que ocorreu poucas semanas após o concurso. A música trata da história de um trabalhador que, ao chegar em casa, leu um bilhete deixado por sua esposa, informando tê-lo abandonado para “viver na orgia”. Totalmente de acordo com os preceitos do regime, a música exalta o homem que, com seu trabalho digno, deu tudo o que sua mulher precisava, esforçando-se no labor, mas terminou por enfrentar a desilusão de vê-la o abandonar sem a gratidão que ele merecia. 

A imagem está, como relatado, no fundo Agência Nacional, no acervo do Arquivo Nacional, acessível por meio do Sistema de Informações do Arquivo Nacional (SIAN). O código de referência é BR_RJANRIO_EH_0_FOT_EVE_08069_d0008de0033 .

No Youtube é possível ouvir a música nesse link: Oh! Seu Oscar. Já a letra pode ser acessada aqui: oh! seu oscar 

Mais informações sobre o concurso você encontra na monografia “Noite de Música Popular: Censura e Propaganda no Estado Novo”, de Isabelle Ribeiro da Silva, no endereço seguinte: Isabelle-Ribeiro-da-Silva-Barros.pdf 

 

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