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Constituição de 1946

 

Durante o Estado Novo (1937-1945), o Poder Legislativo foi extinto, com o fechamento do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, dos Senados Estaduais e Câmaras estaduais e municipais. A Justiça Eleitoral foi alvo do mesmo procedimento de desmonte. Getúlio Vargas governava por meio de decretos-leis, instrumento típico dos regimes de exceção e a Constituição da ditadura do Estado Novo foi outorgada pelo presidente, em 1937, com contornos fascistas e autoritários.

A renúncia de Vargas, em outubro de 1945, selou o processo de derrocada do Estado Novo, e em razão da inexistência do cargo de vice-presidente da República, a direção do país foi assumida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, então criado. José Linhares governou de 30 de outubro de 1945 a 31 de janeiro de 1946 (ASSEMBLEIA ...) e a Constituição dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 18 de setembro de 1946, foi elaborada durante o processo político de redemocratização após o fim da Estado Novo.

Os trabalhos da Assembleia Legislativa foram iniciados em 1 de fevereiro de 1946, sendo desenvolvidos pelo mesmo parlamento eleito no ano anterior, que teve seus poderes constituintes reconhecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral. Em uma eleição em que os analfabetos não puderam votar, o marechal Eurico Gaspar Dutra foi eleito para a Presidência da República, pelo Partido Social Democrático (PSD), com apoio do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). A composição do Congresso, a partir do qual foi formada a Assembleia Nacional Constituinte, era integrada pelo PSD, com mais da metade dos votos, pela União Democrática Nacional (UDN), o PTB, e o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

O cientista político Sérgio Soares Braga analisa o contexto em que a Constituição de 1946 foi elaborada, ressaltando que, no âmbito internacional, o país vivia o imediato pós-guerra, marcado pela percepção de “[...] um clima de ‘pacificação geral’ e de vitória das ‘democracias’ e, posteriormente, pela ‘guerra fria’ [...]” (BRAGA, 1996, p. 10). No plano nacional, o autor salienta o papel dos movimentos de trabalhadores urbanos, que haviam sido desmantelados e perseguidos durante o Estado Novo. Esses retomam sua organização e reivindicações robustecidos pelo Partido Comunista Brasileiro, “[...] partido de base operária, com certa capacidade de mobilização das massas e legal [...].” (BRAGA, 1996, p. 10).

Em linhas gerais, a Constituição de 1946 adotou os seguintes contornos: o regime instituído foi o presidencialista e representativo, sendo o voto, permitido aos maiores de 18 anos, estabelecido como secreto e universal. A exclusão do direito de voto aos analfabetos e soldados, todavia, foi mantida. A Constituição de 1946 também restabeleceu a tripartição de poderes e concedeu maior autonomia aos estados e municípios. O texto conservou direitos previstos em Constituições anteriores, como o habeas corpus, que já integrava as Constituições de 1891 e 1934.

A Constituição de 1946 instituiu, em seu artigo 122, a Justiça do Trabalho, integrando a composição oficial do Poder Judiciário, “para dirimir questões entre empregadores e empregados”. A Carta ainda recupera noções de direito individual, ubiquidade da justiça, e introduz algumas novidades nesse campo. Lança mão dos direitos humanos, intensamente discutidos no contexto do fim da atroz Segunda Guerra Mundial – o parágrafo 13 do artigo 141 afirma: “É vedada a organização, o registro ou o funcionamento de qualquer partido político ou associação, cujo programa ou ação contrarie o regime democrático, baseado na pluralidade dos Partidos e na garantia dos direitos fundamentais do homem.” A Carta salienta a centralidade do Poder Judiciário para a manutenção das liberdades e direitos individuais, em especial em seu Capítulo II do Título IV, que cita preconceitos de classe ou raça como uma das poucas razões para se coibir manifestações de pensamento. Estabelece que não haverá foro privilegiado e nem tribunais de exceção e garante que “ninguém será prêso senão em flagrante delito ou, por ordem escrita da autoridade competente, nos casos expressos em lei.”

Também fixa alguns limites à exploração do trabalho (proibição de jornada noturna a menores, liberdade de associação sindical, assistência aos desempregados) e o direito de greve foi garantido.

Embora garantisse o direito ao voto universal e direto, excluía os analfabetos do sistema eleitoral.

As imagens do presente artigo pertencem ao documento BR_RJANRIO_DK_C46_CST_0001, a Constituição original de 1946, que como todas as constituições e suas emendas, encontra-se no acervo do Arquivo Nacional. CLIQUE NA IMAGEM PARA ACESSAR O DOCUMENTO NA ÍNTEGRA.

 

Referências

 

ASSEMBLEIA CONSTITUINTE DE 1946. Julgados históricos da Jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral. Disponível em: https://www.tse.jus.br/jurisprudencia/julgados-historicos/assembleia-constituinte-1946.

BRAGA, Sérgio Soares. A Constituinte de 11946 e a nova ordem econômica e social do pós-Segunda Guerra Mundial. Revista de Sociologia e Política. n. 6/7, 1996. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/rsp/article/view/39334.

CONSTITUIÇÃO DE 1946. Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. Fundação Getúlio Vargas – Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Disponível em: https://www18.fgv.br/CPDOC/acervo/dicionarios/verbete-tematico/constituicao-de-1946.

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