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O primeiro cinematógrafo, dispositivo criado no final do século XIX que inaugurou uma produção artística e informativa das mais populares e características do século seguinte, pesava cerca de 5 quilos e não usava eletricidade, registrando as imagens em movimento na película através da ação manual de uma manivela.

Distante dos celulares do século XXI, que permitem o registro colorido e realista com um dispositivo que cabe no bolso, durante muitos anos o processo de filmagem, revelação e exibição das imagens em movimento mostrou-se um trabalho complexo e caro, em geral realizado por equipes e empresas do ramo. Filmes para exibição no cinema ou reportagens informativas tornaram-se parte da vida das pessoas, mas sua produção permaneceu restrita a poucos durante muitas décadas. Na segunda metade do século XX, algumas câmaras menores e mais acessíveis, que permitiam uma projeção caseira começaram a popularizar a prática da filmagem, facilitando o registro do cotidiano de “gente comum”, suas viagens, a família, o trabalho, a vizinhança. Estes registros pessoais muitas vezes recebem o nome de filmes domésticos. São filmagens não profissionais cujo objetivo é principalmente, criar lembranças e deixar testemunho da vida de quem filma e das pessoas, lugares e eventos que lhes são caros.

O Arquivo Nacional guarda em seu acervo este tipo de registro, que em geral apresenta alguns aspectos em comum: repetição de imagens, câmera lenta, paradas nas imagens, cortes repentinos, mudança de foco, imagem sem som, cenas muito curtas, de baixa qualidade técnica. Encontramos imagens com som e filmes silenciosos, em preto e branco e coloridos, geralmente em 8mm, Super 8mm ou 16mm. Em sua maioria, integram coleções e fundos privados. Sua importância reside no testemunho de uma época, das vestimentas ao equipamento técnico utilizado, passando por paisagem urbana, modos das pessoas, caracterização de família, etc.

A disseminação de dispositivos de filmagem tende a alterar parâmetros de caracterização de filmes pessoais, domésticos: seu uso intenso aumentou exponencialmente a familiaridade das pessoas com a produção de audiovisual, seja para registrar viagens e celebrações, seja para uso em redes sociais e similares, o que, juntamente com a alta qualidade destes dispositivos (celulares, em especial) resulta em um material que se distingue dos antigos filmes super 8 (por exemplo) por um quase profissionalismo, imagens estáveis, bem focadas, bem pensadas, narrativas complexas. No futuro podemos imaginar os acervos digitais de filmes domésticos – ou pessoais – em instituições de guarda que pouco ficam a dever aos registros profissionais, mesmo confundindo-se com estes. Lembremos que um filme de arquivo não é um filme “velho,” “antigo” – o que caracteriza um filme de arquivo é o propósito da sua produção, sua origem, envolvida nas atividades de quem o produziu, sem a intencionalidade de um objetivo “a posteriori.”

Elysio Martins foi cinegrafista e repórter da extinta TV Tupi. Não à toa o fundo que leva seu nome apresenta lado a lado registros bastante pessoais como também imagens que claramente foram tomadas no contexto do seu trabalho. O filme aqui apresentado, embora pelo tema e contexto de produção seja de fato um filme doméstico, claramente apresenta uma qualidade maior do que o esperado para este tipo de registro na época, já que Elysio era um profissional. Vemos aqui pessoas do seu círculo íntimo, em casa e nas ruas, nas décadas de 1940 e 1950, e mesmo cartelas indicativas das suas identidades.

BR_RJANRIO_F7_0_FIL_0022_d0001de0001. Fundo Elysio Martins.

 

 

 

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