Rompida a aliança política entre São Paulo e Minas Gerais, com o lançamento, pelo Partido Republicano Paulista (PRP), da candidatura de Júlio Prestes para presidente da República, em substituição ao também paulista Washington Luís, findava o acordo de alternância entre mineiros e paulistas no governo federal. Minas Gerais, com apoio do Rio Grande do Sul e da Paraíba, lançaria o gaúcho Getúlio Vargas para a presidência, tendo como vice, o paraibano João Pessoa.
A derrota da chapa de Vargas nas eleições de 1930, fraudada por ambos os lados, desencadeou a retomada das articulações[1] de um movimento que depôs, através de um golpe de Estado, o governo de Washington Luís e que levaria ao fim da Primeira República brasileira. Para o sucesso do que ficou conhecido como Revolução de 1930, o apoio militar, sobretudo, do movimento tenentista, foi fundamental.
O tenentismo foi um movimento político-militar que reuniu militares de baixa patente descontentes com o Estado oligárquico brasileiro. Catalisou o descontentamento de vários setores da sociedade brasileira, excluídos dos mecanismos de poder estabelecidos na Primeira República e que viam no movimento a possibilidade de renovação da política nacional. Seu principal objetivo era derrubar o governo, responsabilizando os políticos civis pela situação caótica do país (FAUSTO, 1976). No entanto, em suas proposições, não tinham programas bem definidos. Defendiam o voto secreto, a centralização administrativa e a ação militar armada como forma de mudar o destino do país.
O movimento tenentista ganhou corpo na década de 1920, responsável por uma série de levantes armados em diferentes estados da federação, como os 18 do Forte de Copacabana (1922), a Revolução Paulista (1924) e a Coluna Prestes (1925-1927). Toda propaganda revolucionária promovida durante o período foi responsável pela construção da imagem dos “tenentes” como agentes transformadores do status quo, e culminaria com a Revolução de 1930.
O fracasso das atuações dos tenentistas, a emigração de oficiais da Coluna Prestes e as prisões e exílios de oficiais sediciosos em diferentes países da América Latina, levou a aproximação dos tenentes com as oligarquias dissidentes – aquelas que estariam fora, ou pelo menos, teriam uma participação reduzida no jogo político – na tentativa de mudar os rumos da República. E, em 1929, fundaram a Aliança Nacional, responsável pela candidatura de Vargas e João Pessoa.
Para os aliancistas, a derrota nas eleições no ano seguinte não deixaria outra saída senão a via revolucionária, que teve como estopim a morte do presidente da Paraíba e candidato derrotado a vice-presidente, João Pessoa[2]. Assim, a revolução inicia sua marcha. Colunas revoltosas, formadas por jovens oficiais do exército, ex-tenentes[3] e civis voluntários, vão percorrer diferentes estados brasileiros, não sem algumas batalhas. As tropas partiram do Rio Grande do Sul, sob a chefia de Góes Monteiro, com destino a São Paulo e depois Rio de Janeiro; da Paraíba, sob o comando de Juarez Távora, com o objetivo de percorrer os estados do Norte e Nordeste; e de Minas Gerais, tendo como líder o tenente coronel Aristarco Pessoa, irmão de João Pessoa.
Com o governo de Minas Gerais comprometido com a revolução e garantindo a vitória do movimento no estado, as tropas revolucionárias mineiras marchariam em direção ao estado do Espírito Santo. A fotografia acima é um registro das forças revoltosas em passagem por Ponte Nova, na Zona da Mata mineira, quando buscavam voluntários para engrossar suas fileiras. Segundo o historiador Fernando Antônio de Moraes Achiamé, mais do que um papel militar, as colunas tiveram uma importância política, pois nas cidades e estados percorridos, destituíram governos e promoveram uma renovação política, deixando, nos locais, figuras chaves ligadas à Revolução. Além disso, a marcha das colunas e/ou os desfiles militares por cada cidade que passavam, contribuíram para “marcar os olhos da população que se construíam novos tempos” (ACHIAMÉ, 2005), angariando o apoio das massas.
Em meados de outubro de 1930, o movimento já era vitorioso em quase todos os estados da federação e, no dia 31, as colunas gaúchas chegariam à capital da República, tendo à frente Getúlio Vargas. Exatamente um mês após a deflagração do movimento, Getúlio chegaria ao poder em 3 de novembro, como chefe do Governo Provisório da República, dando início ao período que conhecemos como Era Vargas.
O Arquivo Nacional guarda em seu acervo fotografias do avanço das tropas revoltosas, que percorreram diversas cidades brasileiras de norte a sul do país. A imagem selecionada faz parte do fundo Godofredo Tinoco (TZ), de origem privada. O escritor e jornalista fluminense teve participação efetiva na articulação política entre líderes do movimento de diferentes estados. Além disso, Tinoco juntou-se à “coluna Gwyer” que, sob o comando do tenentista Gwyer Azevedo, percorreu cidades do norte fluminense. Tinoco pode, assim, registrar importantes imagens da marcha do movimento que derrubou o governo em 1930. Além de cerca de 200 fotografias, o fundo reúne ainda correspondências do titular com várias autoridades e personalidades da época, recortes de jornais e publicações de autoria do titular, que podem ser pesquisadas no acervo do AN.
Lei mais em:
Achiamé, Fernando Antônio de Moraes. Elites políticas espírito-santenses e reformismo autoritário (1930-1937). Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Humanas e Naturais. Vitória, 2005.
Borges, Vavy Pacheco. Tenentismo e Revolução Brasileira. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992.
Rosa, Virgínio Santa. O Sentido do Tenentismo. 3ª ed. São Paulo: Alfa-Ômega, 1976.
Fausto, Boris. A revolução de 1930. A revolução de 1930. História e historiografia. 4a edição. São Paulo: Brasiliense, 1976.
Felipe, Taiany. Godofredo Tinoco e as condições de produção de suas ideias em Campos dos Goytacazes: o espectro de capitalidade na conformação de uma metrópole cultural do Norte Fluminense no século XX. Revista Contemporartes, setembro de 2021.
[1] Correntes mais radicais da Aliança Liberal, já articulavam, no ano anterior às eleições, uma possível ação armada em caso de derrota de Getúlio Vargas à presidência, com o apoio dos “tenentes” que julgavam a via revolucionária a partir dos quartéis, como única forma possível de mudar o sistema política vigente. No entanto, as oligarquias dissidentes apostavam na via eleitoral. Frustrada nas eleições de 1930, os planos de um movimento armado voltaram à mesa.
[2] O crime não teve ligações diretas com as eleições, estaria relacionado a questões internas da oligarquia paraibana, mas logo ganhou repercussão nacional e, aproveitando-se da situação, a Aliança Liberal passou a acusar o governo federal pelo assassinato.
[3] Muito daqueles oficiais que participaram do movimento tenentista, já não tinham mais a patente de tenente após a derrota dos movimentos de 1920, mas o título havia-se generalizado.