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Marcas escritas ou desenhadas de forma irreverente e não-autorizada podem ser encontradas até mesmo em ruínas gregas, romanas, egípcias, realizadas pelos contemporâneos dessas estruturas. Estas marcas – atualmente conhecidas por “pichações” – expressam opiniões, registram acontecimentos, confessam sentimentos, ou funcionam meramente como um adorno que seus autores consideram de valor estético. Proibida por lei em vários momentos, permitida dentro de determinados limites em outros, as pichações fazem parte do cenário urbano, inclusive nas cidades brasileiras. Durante a ditadura militar, ato ilegal e tachado de infame pelos agentes oficiais, a pichação desafiava as normas e a opressão política, recusando-se a calar diante da censura sobre todos os meios de comunicação. Denunciando anonimamente a tortura e a morte, as palavras nos muros não deixavam ninguém esquecer a dura face do regime.

O que você conhece sobre o assunto? Atualmente, como as marcas nos nossos muros são encaradas? Consegue dizer alguma coisa acerca da foto aqui exibida?

 

Comunicar ideias, pensamentos, sentimentos é um atributo humano primordial que ocorre de diversas formas, e desde a aurora do tempo. Páginas de jornais (on line ou impressos) representam um espaço formal onde a informação (e opinião) se coloca, mas há outros espaços, públicos e privados, e muitas vezes bastante insólitos, ocupados por formas de expressão informais e/ou marginais. A pixação (ou pichação, uma forma ainda mais rústica e pouco elaborada) e o grafiti ocupam os muros das cidades mas não são invenções novas, pois há registros da prática há centenas de anos. Variando não apenas na estética, método mas também na intenção do autor, tais registros carregam as marcas da rebeldia e do desafio juvenis, embora de forma alguma a elas se limitem. Atualmente grandes artistas do grafiti compõem suas obras em edifícios e muros das cidades mundo afora e por este trabalho são muito bem pagos, além de receberem merecida notoriedade; por outro lado, permanecem as gangues de pichadores cujo objetivo primordial é deixar sua marca na urbe anônima, em constante disputa territorial com os grupos rivais.

Durante a ditadura civil militar (1964-1985) os muros das cidades ganhavam as palavras de ordem que não podiam ser ditas em público ou escritas nos jornais. Denunciavam a tortura, a censura, as prisões arbitrárias e a morte de opositores do regime e de indivíduos que não se adequavam aos padrões morais vigentes. O hábito invadiu o período democrático, e denúncias de racismo, contra a violência policial e corrupção de políticos continuam a cobrir nossos muros. Juridicamente falando, a pichação é considerada um ato de vandalismo [nos termos do artigo 65 da Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais), que ainda conta com agravante caso o objeto danificado seja tombado] mas o grafiti não, contanto que autorizado por quem de direito e com objetivos de valorização estética do bem afetado.

A imagem aqui exibida é de 1984 e registra uma pixação a tinta (na maioria das vezes atualmente a pichação é realizada com tinta spray) em favor de Tancredo Neves, então governador de Minas Gerais e candidato da oposição aos generais a ser o primeiro presidente da República civil desde 1964, a ser eleito por colégio eleitoral em janeiro do ano seguinte. Tancredo venceu as eleições mas jamais foi empossado, vitimado por tumores e uma infecção generalizada em abril de 1985. José Sarney, um tradicional apoiador da ditadura militar que “embarcou” na chapa de Tancredo Neves em resultado de alianças oportunistas acabou assumindo o cargo, que ocupou até março de 1990.

Imagem: BR_RJANRIO_D7_0_DCO_FOT_0002, fundo João Goulart. [Porto Alegre, 1984]

Leitura recomendada

Martins, C. R. A. (2020). A prática de pichação como manifestação da liberdade de expressão no meio urbano. Trabalho de Conclusão de Curso (Direito) - Centro Universitário de Formiga, 2020.

Silva, A. R. D. A. (2018). Relações entre ativismo digital e pichação política. Monografia de conclusão de curso em Biblioteconomia, UFRJ.

 

 

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