.

 

Artigo 38 do  Código Penal (BRASIL,1940): “o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se  a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”

O sistema prisional brasileiro é notoriamente seletivo: tornou-se lugar comum dizer que só pobre vai para a cadeia – em especial, se for negro. Este lugar comum encontra bases em estatísticas e estudos realizados por instituições, organizações não-governamentais, órgãos do governo (Fórum de Segurança Pública, Instituto de Políticas Econômicas Aplicadas, Sistema Integrado de Informações Penitenciárias, por exemplo) cujo trabalho também enfatiza os níveis de violência policial em nosso país, considerados incompatíveis com uma democracia.

Esta situação é antiga e já vem sendo alvo de preocupações desde a década de 1980, e o desrespeito aos direitos humanos perpetrado no período da ditadura militar (1964-1985) continuou a vicejar, mas com um alvo mais específico: os mais pobres.

O que te chama a atenção na imagem acima ? O que você acha que está por trás dela? O que você conhece sobre o sistema prisional brasileiros e suas mazelas e tragédias?

Em breve responderemos, aqui mesmo nessa matéria.

PARTE 2

Outubro de 2023, e nenhum agente responsável pelo assassinato de presos ocorrido em 2 de outubro de 1992 no presídio conhecido por Carandiru (São Paulo) encontra-se preso. Entre idas e vindas de tribunais e julgamentos, 74 PMs chegaram a ser condenados, mas após recursos aceitos e depois negados, ainda se encontram em liberdade.

Ao realizar qualquer pesquisa exploratória no google sobre o tema “sistema prisional brasileiro” deparamo-nos com retornos desanimadores: “ONU vê tortura em presídios como problema estrutural do Brasil”, “Brasil tem mais de 800 mil presos e déficit de 200 mil vagas”, “Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo”, “Brasil chegou a mais de 900 mil presos durante a Covid-19”... muitos são artigos acadêmicos ou matérias de páginas oficiais do governo que dão conta dos tristes dados das nossas prisões.

A rebelião no Carandiru teve início após uma briga entre facções rivais durante um jogo de futebol entre detentos do Pavilhão 9, que abrigava réus primários e muitos ainda sem condenação. O conflito localizado acabou se espalhando pela penitenciária, transformando-se em um quebra-quebra generalizado que incluiu a clássica queima de colchões. A polícia militar, liderada pelo coronel Ubiratan Guimarães, invadiu o pavilhão com 341 policiais armados com armas de grosso calibre (incluindo submetralhadoras e fuzis) e abriu fogo sistemático contra os detentos, em uma ação que disparou 3,5 mil tiros ao longo de 20 minutos, e matou 111 pessoas.

Nenhum policial morreu.

A intervenção na rebelião do Carandiru, autorizada pelo secretário de Segurança Pública de São Paulo, Pedro Franco de Campos, chocou o mundo e mesmo os brasileiros, acostumados às chacinas promovidas pela polícia, e a impunidade subsequente juntou-se à longa lista de crimes cometidos pelo Estado brasileiro e seus agentes que jamais foram.

O maior massacre jamais realizado por uma força policial no Brasil representa o exemplo máximo do fragoroso fracasso do nosso sistema prisional, que falha não apenas em manter a segurança e a dignidade da pessoa humana que se encontra sob tutela do Estado mas também no momento da ressocialização do infrator, que em sua grande maioria não consegue se inserir no mercado de trabalho formal e muitas vezes retorna ao sistema carcerário.

O Depen (Departamento penitenciário nacional) , órgão do Ministério da Justiça, informou que o total de encarcerados no país é de 811 mil pessoas. Das 1.381 unidades prisionais, 997 têm mais de 100% da capacidade ocupada e outras 276 estão com ocupação superior a 200%. Sobram vagas em apenas 363 prisões. Fonte: Agência Câmara de Notícias.

Independente do seu crime e da sua pena, o detento mantém direitos que devem ser respeitados e pelos quais o Estado, sob cuja tutela se encontra, deve zelar. Em especial, os direitos humanos, estabelecidos inclusive em tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário, não devem ser enxovalhados com a torpe justificativa de que se está preso, deve merecer qualquer tratamento. A lógica do “bandido bom é bandido morto” não encontra respaldo na legislação brasileira – que não incorpora a pena de morte – e agride o mais básico sentido de lógica e dignidade.

Documentos do acervo do Arquivo Nacional:

Imagem tirada de br_dfanbsb_zd_0_0_0048a_0013_d0004: Cadernos n. 5 – Violência e organização popular de justiça e paz – Comissão pontifícia justiça e paz do Paraná. Fev 1983, fundo Divisão de Inteligência do Departamento de Polícia Federal

Áudio br_rjanrio_ha_0_dso_pnb_0179_d0001de0002. Trecho do Programa 179: Morre o “Senhor Diretas Já”, Ulysses Guimarães; Eleições de outubro mudam a cara do Brasil; Massacre de São Paulo reascende a questão dos presídios; Ódio e preconceito querem trazer de volta o horror do nazismo. 1992, fundo IBASE

Recomendações de leitura e fonte de informações/ dados:

MACHADO, Nicaela Olímpia; GUIMARÃES, Issac Sabbá. A Realidade do Sistema Prisional Brasileiro e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 5, n.1, p. 566-581, 1º Trimestre de 2014. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044.

https://forumseguranca.org.br/publicacoes/sistema-prisional/

Todo o conteúdo deste site está publicado sob a licença  Creative Commons Atribuição-SemDerivações 3.0 Não Adaptada.