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Iniciativas que buscam trazer para o campo institucional as demandas dos movimentos feministas ocorrem pelo menos desde os anos 1970, seja no contexto das entidades internacionais multilaterais, seja dentro da estrutura dos próprios estados nacionais. Tais iniciativas buscavam incentivar a participação das mulheres nestas entidades e instituições políticas. A Primeira Conferência Mundial sobre a Situação da Mulher, realizada no México em 1975, representou um marco neste sentido, que além de buscar conscientizar o mundo acerca da persistente discriminação de gênero e as desigualdades de direitos conquistados pelas mulheres nos vários países que constituem a comunidade internacional, apresentou desdobramentos como o Plano de Ação apresentado 2 anos depois, que entre outras coisas convocava os governos a fornecer recursos (financeiros e humanos) para a criação de estruturas administrativas capazes de acolher as demandas das mulheres.

Também na década de 1970, no contexto de rearticulação dos movimentos sociais, o movimento feminista passa a integrar a arena política, integrando não apenas o coro por um retorno à democracia mas apresentando as próprias pautas: “No contexto brasileiro, os movimentos feministas pautaram suas lutas com o objetivo de promover a visibilidade pública de suas reivindicações e, consequentemente, alcançar a legitimidade destas. Refutando a idéia de que estariam quebrando a unidade da oposição, as feministas buscaram interlocução com sindicatos, universidades e outros espaços organizacionais (associações médicas, de engenheiras, OAB, entre outras) para ampliar sua rede de atuação.”[Pimenta] Participando ativamente da campanha pela anistia, das eleições para governador em 1982 e das Diretas-Já, o movimento de mulheres traz também neste período a emergência do feminismo negro.

Foi a partir principalmente do envolvimento na campanha pelas Diretas-Já que o movimento das mulheres passa a pressionar o governo pela criação de um órgão, em escala federal, para atender às suas demandas específicas, incentivando também a participação das mulheres nas instâncias de representação política da sociedade. Esta aproximação com as instituições estatais não era um consenso entre as feministas, embora houve uma compreensão geral de que algum tipo de interlocução se fazia necessária e que a criação de um órgão ou instância na estrutura de governo se tornara imprescindível.

Uma parcela do movimento se dispunha a participar das estruturas institucionais do Estado (aplicando a questão de gênero nas políticas públicas), outras se limitariam a apoiar as primeiras a partir do seu local de luta, inseridas na sociedade civil, e uma terceira vertente optava pela autonomia completa da sua atuação. As discussões em torno da criação do novo órgão ganharam dimensões nacionais e integradas em 1985, no VII Encontro Nacional Feminista, durante o qual formalizou-se pela primeira vez uma proposta de criação do Conselho Nacional de Direitos da Mulher. Não sem polêmicas quanto a sua forma e composição, sua criação foi aprovada em agosto daquele ano. O CNDM foi instituído pela Lei 7.353 / 1985 com a finalidade de formular e propor diretrizes de ação governamental voltadas à promoção dos direitos das mulheres e atuar no controle social de políticas públicas de igualdade de gênero.

O Conselho mostrou-se crucial para a conquista de direitos na Constituição outorgada em 1988. Atuando desde as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte em 1986 e até a aprovação de várias emendas defendidas pela bancada feminina, passando pela organização do Encontro Nacional Mulher e Constituinte, que teve como desdobramento a da Mulher Brasileira aos Constituintes, o CNDM contribuiu para a eleição de 26 constituintes eleitas e para a articulação entre diversas entidades, militantes, intelectuais e políticas em torno da elaboração da nova Constituição. A atuação política das mulheres na Assembleia Constituinte ficou conhecida como Lobby do batom, e os detalhes desta história  podem ser conhecidos no texto da pesquisadora Januária Teive.

Como órgão colegiado composto por representantes da sociedade civil, especialistas independentes e agentes do poder público federal, esteve sob risco com a publicação do decreto nº 9.759, assinado pelo atual presidente em 2019, que na prática torna inviável o funcionamento de órgãos do tipo. No entanto, felizmente o risco parece ter sido afastado com a publicação do edital para a seleção das entidades da sociedade civil que irão compor o conselho no triênio 2021-2024. https://www.gov.br/participamaisbrasil/processo-seletivo-cndm-20212

O fundo Conselho Nacional de Direitos da Mulher (EZ) possui documentação textual, fotografias, cartazes e filmes institucionais (campanhas contra violência doméstica, sobre á história do feminismo, mercado de trabalho, etc). A documentação encontra-se na sede do Arquivo Nacional no Rio de Janeiro e também na Coordenação Regional, em Brasília. O Que República é essa?  já publicou vídeos do fundo, que pode ser acessado pelo SIAN.

Leitura recomendada

Araújo, M. G. M. (2014). Feminismo e o Estado: relações possíveis a partir do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

Pimenta, F. F. (2010). Políticas feministas e os feminismos na política: o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (1985-2005).

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