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O Hospício Nacional de Alienados, herdeiro do imperial Hospício d. Pedro II (inaugurado em 1852 para abrigar indivíduos acometidos de “moléstias mentais,” considerados “insanos”, residentes na Corte) esteve sob direção do médico baiano, educado na Europa, Juliano Moreira a partir de 1903, quando foi iniciado o processo de reorganização do Serviço de Assistência a Alienados, momento fundamental para o estabelecimento do campo psiquiátrico no Brasil. Juntamente com o professor de moléstias nervosas da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro Teixeira Brandão (também primeiro diretor da Assistência Médica e Legal de Alienados), Juliano Moreira representava os anseios de uma parcela considerável de médicos e pesquisadores que propunha uma racionalização maior no trabalho com os doentes mentais, transformando hospitais psiquiátricos em instituições de pesquisa e tratamento, em lugar apenas de um depósito de insanos e espaço assistencial. Juntamente com a reorganização do Hospício d. Pedro II (doravante Hospício Nacional dos Alienados) e da política de saúde mental como um todo, o início do século XX trouxe a instalação de colônias de alienados, eminentemente agrícolas, uma tendência mundial em tratamento psiquiátrico.

Iniciativas para tornar o espaço do interno menos hostil (sem grades ou camisas de força, sempre que possível) passaram a fazer parte da política de saúde pública para doentes mentais. Estudos sistemáticos dos diferentes estados de loucura passaram a ser realizados, incluíndo moléstias orgânicas que pudessem levar a tal estado (por exemplo, a sífilis, ainda sem cura na época). Diretor do Hospital até 1930, Juliano Moreira _ homem negro de família humilde _ debateu intensamente ideias racistas em voga no início do século passado, enfatizando antes os males do que considerava maus hábitos (alcoolismo, por exemplo) e doenças infecciosas causadas por condições sanitárias precárias.

O complexo psiquiátrico ocupava extensa área em Botafogo/ Urca, no Rio de Janeiro. Depois da saída de Moreira da direção, o chamado complexo da Praia Vermelha entrou em decadência, e parte dos seus internos foram transferidos para o Hospital do Engenho de Dentro, sob o comando de Nise da Silveira, ou para a Colônia de Alienados de Jacarepagua que ganharia seu nome em 1935. Parte das suas instalações atualmente abriga o Instituto de Psiquiatria da UFRJ; instalações do antigo Instituto de Neurosífilis (criado em 1927, também parte do complexo) transformaram-se no Instituto Philippe Pinel em 1965.

A Colônia Juliano Moreira originou-se da colônia para alienados Fazenda do Engenho Novo, ampla área ainda dominada pela natureza inaugurada em 1923 e que passou a receber então internos do complexo da Praia Vermelha e de outras colônias anteriormente localizadas na Tijuca e Ilha do Governador.

A despeito das iniciativas modernizantes, da utilização de recursos de arteterapia e do enfrentamento de doenças mentais com metodologia científica, durante décadas o espaço asilar foi um escoadouro para todo tipo de indesejáveis e párias sociais: de jovens mães que passavam a apresentar um discurso feminista, a homens pobres que levantavam barricadas nas ruas das grandes cidades em protesto contra violações dos seus direitos, passando por homossexuais e perurbadores da ordem e da moral de vários matizes. Parte dos pacientes dos institutos psiquiátricos no Brasil e também no mundo não apresentavam outra doença senão uma busca por padrões diferenciados de comportamento ou simplesmente, mudanças de cunho social.

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Documentos:

BR DFABR RJANRIO PH.0.FOT.6970.003 Internos da Colônia Juliano Moreira. S.d. Correio da Manhã.

BR RJANRIO PH.0.FOT.35126.002. Dr Juliano Moreira e Miles Voughn em Tókio, s.d. Correio da Manhã.

BR RJANRIO PH.0.FOT.6641.001. Hospital Psiquiátrico Instituto Philippe Pinel, s.d. Correio da Manhã.

 NBSB V8.MIC, GNC.AAA.80008955: Dossiê de 1980. Troca de ofícios acerca de uma reportagem da Rede Globo de televisão sobre as condições na Colônia Juliano Moreira. Relatórios explicitando as condições das instalações na colônia, em alguns casos considerada péssimas. Serviço Nacional de Informações.

Sugestões de leitura

http://historiaeloucura.gov.br/index.php/

 

https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-humanas/pacientes-do-sanatorio-pinel-incluiam-homossexuais-e-mulheres-cultas/

 

Facchinetti, Cristiana, Ribeiro, Andréa e Muñoz, Pedro F. deAs insanas do Hospício Nacional de Alienados (1900-1939). História, Ciências, Saúde-Manguinhos [online]. 2008, v. 15, n. suppl [Acessado 19 Julho 2021] , pp. 231-242. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-59702008000500012>. Epub 03 Jul 2008. ISSN 1678-4758. https://doi.org/10.1590/S0104-59702008000500012.

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